Como a Itália deixou de ser um mosaico de reinos e tornou-se um Estado nacional

A Itália nem sempre foi o país unificado que conhecemos hoje. Aliás, o Estado italiano, tal como o entendemos atualmente, é uma criação relativamente recente: sua fundação oficial data de 1861. Mas como foi possível passar de uma península fragmentada em reinos, ducados e territórios estrangeiros a uma nação soberana e moderna?

Uma unidade sonhada desde a Antiguidade

A ideia de que a Península Itálica forma uma entidade cultural coesa remonta já à Antiguidade. Durante o período romano, esse território era visto como um todo unificado — algo que se perdeu com a queda do Império Romano, quando a região passou a ser dominada por uma sucessão de povos: bárbaros, árabes, vikings, franceses, austríacos, espanhóis, entre outros.

É nesse contexto que surge o termo “Risorgimento”, literalmente “renascimento”. A palavra expressa a aspiração de recuperar a glória de uma Itália histórica — da Roma Antiga, dos Comuni medievais e do Renascimento — após séculos de decadência sob dominação estrangeira. A localização estratégica da península no centro do Mediterrâneo sempre fez dela um território altamente cobiçado.

A geografia política da Itália antes da unificação

A fragmentação política da península foi reforçada após o Congresso de Viena (1815). O mapa ficou assim:

geografia política da Itália antes da unificação

  • Noroeste: Reino da Sardenha (ou Piemonte-Sardenha), governado pela Casa de Saboia.
  • Nordeste e Lombardia-Vêneto: sob domínio direto do Império Austríaco.
  • Centro: diversos pequenos estados, incluindo o Grão-Ducado da Toscana, ducados menores e os Estados Pontifícios, governados pelo Papa.
  • Sul: Reino das Duas Sicílias, controlado pela dinastia Bourbon.

O papel das ideias iluministas e românticas

O impulso para o processo de unificação veio das ideias políticas e filosóficas surgidas no Iluminismo e no Romantismo. Conceitos como nação, liberdade, cidadania e autodeterminação ganharam força entre as elites intelectuais, burguesas e mesmo setores da aristocracia.

O Risorgimento foi, portanto, em sua origem, um movimento liderado por minorias ilustradas — e não por uma mobilização popular ampla.

Revoltas, insurreições e as primeiras guerras

Unificação da Itália 

Entre as primeiras expressões do Risorgimento, encontramos diversos motins e revoltas — sobretudo nas décadas de 1820 e 1830 —, que tinham como objetivo principal obter constituições liberais nos estados individuais, e não necessariamente a unificação nacional. A maioria dessas revoltas foi rapidamente reprimida.

Algumas das revoltas mais importantes desse período foram:

  • Revolta de Nápoles (1820): exigência de constituição liberal; reprimida pela intervenção austríaca.
  • Revolta de Palermo (1820-21): tentativa de independência da Sicília; também sufocada.
  • Revoltas no Piemonte e Sardenha (1821): lideradas por militares liberais; reprimidas.
  • Revoltas na Emilia-Romagna (1831): promovidas pela “Jovem Itália”, movimento de Mazzini; fracassadas.
  • Revolta de Savóia (1834): tentativa de invasão revolucionária a partir da Suíça; mal sucedida.

A grande onda insurrecional viria em 1848, ano de grandes revoluções por toda a Europa. 

grandes revoluções

Revoltas aconteceram em Palermo, Nápoles, Roma, Milão e Veneza. Os objetivos eram a concessão de constituições e a independência do domínio austríaco. A mais célebre foi a das Cinco Jornadas de Milão, em que os insurgentes conseguiram expulsar os austríacos da cidade com o apoio do Reino da Sardenha, dando início à Primeira Guerra de Independência.

Em 1849, no entanto, os austríacos retomaram o controle do norte e outras revoltas também foram esmagadas. As constituições concedidas às pressas foram revogadas, com uma exceção: no Reino da Sardenha, o Estatuto Albertino, promulgado por Carlo Alberto, foi mantido por seu sucessor, Vittorio Emanuele II, e servirá de base para a futura constituição italiana.

As quatro correntes políticas do Risorgimento

Após os eventos de 1848-49, a ideia da unificação ganhou mais força entre as elites. A bandeira tricolor passou a circular mais amplamente e começou um processo de criação de símbolos nacionais. Contudo, havia divergências profundas sobre como unificar a Itália e que tipo de Estado construir. Destacam-se quatro correntes principais:

  • Moderados: defendiam uma unificação pacífica ou militar, mas por vias diplomáticas, sem revoluções. Queriam uma monarquia constitucional liderada pelos Saboia. Principal figura: Camillo Benso, Conde de Cavour.
  • Democráticos: queriam a unificação por meio de revoltas populares e defendiam a criação de uma república unificada. Principal figura: Giuseppe Mazzini.
  • Neoguelfos: propunham uma confederação de estados autônomos sob a liderança espiritual e política do Papa. Principal figura: Vincenzo Gioberti.
  • Federalistas: desejavam uma federação de estados independentes, unidos por laços culturais e econômicos. Figura destacada: Carlo Cattaneo.

A estratégia diplomática de Cavour e o apoio francês

Conde de Cavour

A corrente moderada, liderada por Cavour, acabou prevalecendo. Nomeado primeiro-ministro do Reino da Sardenha em 1852, Cavour visava expandir o território do reino — inicialmente apenas até a Lombardia e o Vêneto — e fortalecer seu prestígio na Europa.

Em 1858, Cavour assinou um acordo secreto com o imperador francês Napoleão III (Acordos de Plombières). A França prometia intervir numa guerra contra a Áustria, em troca dos territórios de Nice e Sabóia, então pertencentes ao Reino da Sardenha.

A Segunda Guerra de Independência e os plebiscitos

Segunda Guerra de Independência

Em 1859, Cavour provocou a Segunda Guerra de Independência. França e Piemonte enfrentaram os austríacos e venceram em batalhas como Magenta e Solferino. No entanto, a situação complicou-se: nas regiões centrais da península (Toscana, Módena, Parma), surgiram levantes populares que culminaram em plebiscitos, nos quais as populações decidiram se anexar ao Reino da Sardenha.

Diante da reconfiguração inesperada da península, Napoleão III retirou seu apoio e assinou um acordo separado com a Áustria. O Piemonte obteve apenas a Lombardia, enquanto o Vêneto permaneceu sob controle austríaco.

A Expedição dos Mil e a conquista do Sul

Expedição dos Mil

Faltava o Sul. Em 1860, o general Giuseppe Garibaldi liderou a famosa Expedição dos Mil: cerca de mil voluntários desembarcaram na Sicília, com o objetivo de conquistar o Reino das Duas Sicílias. Garibaldi recebeu apoio de voluntários locais e venceu batalhas importantes, levando ao colapso do regime Bourbon.

Garibaldi entregou os territórios conquistados ao rei Vittorio Emanuele II, permitindo a anexação do Sul ao novo Estado.

A proclamação do Reino da Itália

proclamação do Reino da Itália

Em 17 de março de 1861, o Parlamento reunido em Turim proclamou oficialmente o Reino da Itália, com Vittorio Emanuele II como rei. A unificação, porém, ainda não estava completa: 

o Vêneto foi incorporado apenas em 1866, após a Terceira Guerra de Independência, e Roma, então sob controle do Papa e protegida por tropas francesas, só foi anexada em 1870, após a queda de Napoleão III.

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