Por: Paola Baccin
Se você acompanha os artigos que estamos publicando, deve ter percebido que língua e
cultura são inseparáveis. Aprender verbos, artigos, pronomes, sem inserir esses elementos
linguísticos em una cornice culturale [moldura cultural] nos obriga a decorar e repetir sem
compreender perfeitamente quando usá-los.
Hoje vamos apresentar três verbos: essere [ser e estar], chiamarsi [chamar-se] e venire
[vir], mas vamos fazê-lo falando sobre comunicação intercultural.
A diferença entre o tratamento formal e informal (trattamento formale e informale) vai
retornar várias vezes nos nossos artigos, porque a escolha inadequada de um ou de outro pode
prejudicar a comunicação, uma vez que atinge o nosso interlocutor de maneira involuntária.
Imaginem que você, já não mais um adolescente, esteja andando pela rua e uma pessoa
se dirija a você com um: fala aí, vei, onde fica o metrô? A comunicação existiu, provavelmente
você entendeu a pergunta e sabe responder. O problema está no modo como você se sentiu ao
ser abordado dessa forma.
Você lembra da primeira vez que um desconhecido lhe tratou por senhor ou senhora?
Nesse caso, também, provavelmente percebemos que o tratamento era inadequado, já que ainda
nos considerávamos jovens demais e não estávamos prontos para ouvir. A comunicação existiu,
mas a nossa “impressão” sobre a pessoa com quem estávamos falando foi prejudicada.
A nossa visão de mundo determina o que consideramos “normal” na comunicação. No
Brasil, achamos “normal” pedir uma informação usando a frase: “Oi, desculpe, você pode me
dizer…” ou então, “oi, dá licença, você sabe…”, se nos dirigimos a uma pessoa muito mais velha
podemos escolhemos dizer algo como “bom dia, o senhor (a senhora) sabe…”.
Na Itália a escolha do tratamento é um pouco mais complexa. Os materiais didáticos,
geralmente nos ensinam que há o “trattamento formale” e o “trattamento informale”, mas há
também o que eu chamo de “media formalità”.
Il trattamento informale
Para o trattamento informale usamos o pronome tu. Os verbos e os pronomes ficam na
segunda pessoa e usamos o primeiro nome:
Verbo essere
Tu sei italiano? [Você é italiano?]
Sei, tu, Pedro? [É você, Pedro?]
Sei già stato in Italia? [Você já esteve na Itália?]
Verbo chiamarsi
Ti chiami Pedro de Oliveira? [Você se chama Pedro de Oliveira?]
Hai chiamato tua moglie? [Você telefonou para a sua esposa?]
Verbo venire
Vieni da Salvador di Bahia? [Você vem de Salvador da Bahia?]
Sei venuto in macchina o in treno? [você veio de carro ou de trem?]
O trattamento informale é usado quando falamos com amigos, colegas, entre jovens,
quando um adulto fala com uma criança ou com um adolescente. E, nesses casos, corresponde
ao uso do “tu” ou do “você” em português.
Em italiano o trattamento informale é empregado quando falamos com parentes, não
importa a idade. No Brasil, há famílias nas quais os jovens tratam o pai, o avô, os tios, a mãe,
a avó, as tias por “o senhor, a senhora”. Na Itália, todos os familiares são considerados íntimos,
portanto, o tratamento será sempre informal:
Outra diferença interessante é que, enquanto no Brasil, nas orações, usamos o pronome
“vós”, na Itália emprega-se o tu, já que Deus é pai e Maria é mãe, usa-se o trattamento informal:
Padre nostro, che sei nei cieli…
[Literalmente: Pai nosso, você que está no céu…]
Ave Maria, piena di grazia, il Signore è con te …
[Literalmente: Ave Maria, cheia de graça, o Senhor é contigo…]
Até há alguns anos, era impensável que um commesso [vendedor de loja] ou um barista
tratasse um cliente usando tu. Hoje, observa-se que, aos poucos, essa é a escolha para reduzir a
distância e indicar que há “uma amizade, uma cumplicidade” com o cliente. Ao entrar em uma
loja, ou um bar na Itália você pode ouvir diferentes formas de tratamento:
Tratamento formal: Buongiorno, signora (signore), posso aiutarla?
Tratamento informal: Buongiorno, serve aiuto? Posso aiutarti?
Em caso de dúvida, se você quer reduzir as distâncias, usando o trattamento informale,
pode sugerir no momento da apresentação:
Possiamo darci del tu?
Posso darti del tu?
[Posso tratá-lo por você?]
Mas, atenção! Nunca use, nem sugira, o tratamento informal quando se dirigir a
policiais, médicos, enfermeiros, professores, advogados, engenheiros, funcionários públicos,
faxineiros, camareiras e outras pessoas que estejam em um papel profissional ou oficial. Nesses
casos, ou na dúvida, use sempre o trattamento formale.
Il trattamento formale
Para o trattamento formale usamos o pronome Lei e nos dirigimos à pessoa com quem
estamos falando, usando o sobrenome e, eventualmente, o título. Os verbos e os pronomes ficam
na terceira pessoa.
Muitos estudantes confundem o pronome pessoal lei e o pronome de tratamento Lei.
O primeiro, lei, é usado apenas para falar de (sobre) pessoas do gênero feminino e corresponde
a “ela”, em português. Para falar de ou sobre pessoas do gênero masculino usamos lui [ele]:
Lei è mia figlia Anna e lui è mio figlio, Pietro.
[Ela é a minha filha Ana, e ele é o meu filho Pietro.]
Mia nonna è italiana e mio nonno è spagnolo.
Lei è di Belluno e lui è di Madrid.
[Minha avó é italiana e o meu avô é espanhol.
Ela é de Belluno e ele, de Madri.]
O pronome de tratamento Lei não é usado para falar sobre alguém, mas para se dirigir
a alguém, portanto, assim como o tu, é usado tanto para o masculino, quanto para o feminino.
Em português, corresponde a “o senhor”, “ a senhora”:
Verbo essere
Lei è italiano? [O senhor é italiano?]
Lei è italiana? [A senhora é italiana?]
Lei è Pedro de Oliveira? [O senhor é o Pedro Oliveira?]
È già stato in Italia? [O senhor (a senhora) já esteve na Itália?]
Verbo chiamarsi
Lei si chiama Pedro de Oliveira?
[O senhor se chama Pedro de Oliveira?]
Lei ha chiamato Sua moglie?
[O senhor telefonou para a sua esposa?]
Verbo venire
Viene da Salvador di Bahia?
[O senhor (a senhora) vem de Salvador da Bahia?]
È venuto in macchina o in treno?
[O senhor (a senhora) veio de carro ou de trem?]
No Brasil, há alunos que tratam o professor de “você” e o professor sempre trata o aluno
por “você”. Na Itália, em sala de aula, e na relação entre docentes e alunos, emprega-se sempre
o tratamento formal.
O aluno brasileiro de italiano, pensando em como funciona a língua portuguesa, costuma
usar signor e signora como pronome de tratamento. Atenção: Lei já significa “o senhor” ou “a
senhora”:
Buongiorno, prego, si accomodi.
[Bom dia, senhor(a), por favor, fique à vontade.]
Em situações de alta formalidade pode-se adicionar signore(a) à frase.
Buongiorno, signore(a), prego, si accomodi.
[Bom dia, senhor(a), por favor, fique à vontade.]
Isso equivale a adicionar o título da pessoa com quem estamos falando. No Brasil, à
parte os títulos “professor” e “doutor”, não usamos as profissões quando nos dirigimos a uma
pessoa. Em italiano, para mostrar respeito, pode-se fazê-lo:
Buongiorno, avvocato, prego, si accomodi. [advogado]
Buongiorno, architetto, prego, si accomodi. [arquiteto]
Buongiorno, ragioniere, prego, si accomodi. [contador]
Buongiorno, ingegnere, prego, si accomodi. [engenheiro]
Buongiorno, onorevole, prego, si accomodi. [deputado ou senador]
La media formalità
Vimos que il tratamento informale (tu) é empregado para falar com pessoas amigas,
íntimas, jovens e com a família. Il tratamento formale (Lei) é usado para demonstrar respeito,
não apenas em relação à idade do interlocutor, mas ao seu cargo, por isso devemos lembrar de
usar sempre o Lei em relações profissionais.
Para se dirigir a uma pessoa com a qual não temos intimidade, à qual queremos
demonstrar respeito, mas, em relação à qual queremos, ao mesmo tempo, diminuir a distância,
podemos usar a media formalità. Usamos a terceira pessoa Lei, mas com o primeiro nome.
È o caso de suocero e suocera [sogro(a)]. O genro (genero) ou a nora (nuora) podem
optar pela media formalità, ou seja usar o primeiro nome e os verbos na terceira pessoa.
Suocero: Ciao, Francesco, come stai?
Genero: Salve, Bruno, bene, grazie.
Lei piuttosto, come sta? Le sono passati i giramenti di testa?
[Sogro: Oi Francesco, como vai?
Genro: Oi Bruno, bem, obrigado. Mas e o senhor? Melhorou da tontura?]
I saluti
Na língua falada, para cumprimentar, usamos as seguintes fórmulas que vão do registro
mais formal ao mais informal. Aqui, cabe distinguir as fórmulas para cumprimentar quando se
encontra alguém ou para se despedir.
Quando encontramos alguém podemos dizer buongiorno ou buonasera.
A divisão entre giorno e sera não é precisa. O primeiro é usado durante o dia todo,
enquanto há luz, por isso, depende também da estação do ano. No verão podemos dizer
buongiorno até as cinco da tarde, enquanto no inverno, quando os dias são mais curtos, às 4
horas já se pode dizer buonasera. Não se usa buonanotte para cumprimentar quando se encontra
alguém, pois é uma fórmula de despedida.
Existe também o buon pomeriggio, que pode ser usado após o meio-dia. É muito menos
frequente do que buongiorno.
Além dessas duas expressões, na media formalità podemos empregar também salve e
no registro informale, ciao ou salve que correspondem ao nosso “oi” ou “olá”.
Para se despedir, o leque de expressões é muito maior. No tratamento formal e na média
formalidade emprega-se: arrivederla ou arrivederci que corresponde ao português “até logo”.
Além dessas duas, você pode escolher muitas outras formas para se despedir que podem ser
usadas em todos os registros: buona giornata, buon pomeriggio, buona serata, buonanotte.
Se encontramos pessoas que estão realizando uma atividade, como amigos em um
restaurante ou na fila do teatro, podemos nos despedir dizendo: buon prosseguimento.
No âmbito da media formalidade e da informalidade podemos dizer, também: a presto,
alla prossima.
Para despedidas informais temos ainda: ciao, ci vediamo, ci sentiamo.
Lembre-se de não usar ciao para se despedir de profissionais, funcionários e todas as
pessoas com as quais deve-se usar o tratamento formal.
Scusa ou scusi?
Essa é uma dúvida que se apresenta sempre e que, no momento da comunicação, deve
ser resolvida rapidamente.
Scusa – trattamento informale
Scusi – trattamento formale
Verbo essere
O verbo essere corresponde aos verbos “ser” e “estar” em italiano, veja nos exemplos
abaixo:
João: Sono brasiliano e tu di dove sei?
Vera: Anch’io sono brasiliana, di Brasilia e sono qui in Italia per motivi di lavoro.
João: Sono contento di averti conosciuta, perché sono qui da un mese
e non ho fatto ancora molte amicizie.
Vera: Sei in Italia per la prima volta?
João: Eu sou brasileiro e você de onde é?
Vera: Eu também sou brasileira, de Brasília e estou aqui na Itália a trabalho.
João: Estou feliz por tê-la conhecido, estou aqui há um mês
e ainda não fiz muitas amizades.
Vera: Você está na Itália pela primeira vez?
Presente
Io sono Francesco.
[Eu sou o Francesco.]
Io sono in Italia per lavoro.
[Eu estou una Itália a trabalho.]
Tu sei bella.
[Você é bonita.]
Tu sei contenta?
[Você está contente?]
Lui è brasiliano.
[Ele é brasileiro]
Lui è in Brasile.
[Ele está no Brasil.]
Noi siamo autisti.
[Nós somos motoristas.]
Noi siamo stanchi di lavorare.
[Estamos cansados de trabalhar.]
Voi siete amici?
[Vocês são amigos?]
Voi siete a casa?
[Vocês estão em casa?]
Loro sono marito e moglie.
[Eles são marido e mulher.]
Loro sono ammalati.
[Eles estão doentes.]
No passado os verbos essere [ser, estar] e stare [ficar] têm a mesma forma e, em alguns
exemplos, podem corresponder ao verbo “ir” em português, sobretudo a frase “você já foi à
Itália?” corresponde a “sei mai (già) stato in Italia?”:
Passato
Verbo essere Verbo stare
Io sono stato in Italia l’anno scorso. Io sono stato a casa, non sono uscito.
[Eu estive (fui) à Itália o ano passado.] [Eu fiquei em casa, não saí.]
Tu sei mai stata in Sicilia?
[Você ja esteve (foi) à Sicilia?]
Tu sei stata bene a casa loro?
[Você ficou bem na casa deles?]
Verbo chiamarsi
O verbo chiamarsi corresponde ao verbo “chamar-se” e na sua forma não reflexiva
corresponde também a “telefonar”. Todos os verbos reflexivos pedem o auxiliar essere nos
tempos compostos como o passato.
Presente Passato
Mi chiamo Mi sono chiamato(a)
Ti chiami Ti sei chiamato(a)
Si chiama Si è chiamato(a)
Ci chiamiamo Ci siamo chiamati(e)
Vi chiamate Vi siete chiamati(e)
Si chiamano Si sono chiamati(e)
Verbo venire
O verbo venire corresponde ao verbo “vir” pede o auxiliar essere nos tempos compostos
como o passato e deve ser considerado sempre em relação ao verbo andare. Em outro artigo
trataremos especificamente do emprego desses dois verbos que, em muitos casos, não
corresponde ao português.
Presente/ Passato
Vengo spesso in Italia. Sono venuto(a) due volte in Italia.
Vieni con me al supermercato? Sei venuto(a) anche tu al supermercato?
Viene anche lei a Roma? È venuto(a) a Roma in treno.
Veniamo domani. Siamo venuti(e) ieri.
Venite dalla nonna? Siete venuti(e) dalla nonna insieme?
Vengono stamattina. Sono venuti(e) ieri mattina.
Texto: Paola Baccin
Desenhos: Airam Ribeiro
Sobre a autora: Paola Baccin é docente nos cursos de graduação e pós-graduação em língua e
literatura italiana da Universidade de São Paulo.